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Miséria, a grande inimiga da liberdade humana

Calcula-se que novos 115 milhões de pessoas foram empurradas para essa grave situação, e que esse número pode saltar para 150 milhões no decorrer de 2021.

“A privação da liberdade econômica na forma de pobreza extrema, pode tornar a pessoa uma presa indefesa na violação de outras formas de liberdade.”

Amartya Sen

Estimativa do Banco Mundial acerca do impacto negativo da pandemia do Coronavírus, feita no final do ano passado e reiterada por estudos recentes de outras organizações no Brasil e no exterior, acende o sinal vermelho de que pela primeira vez em mais de duas décadas, a pobreza extrema está avançando de maneira cruel.

Calcula-se que novos 115 milhões de pessoas foram empurradas para essa grave situação, e que esse número pode saltar para 150 milhões no decorrer de 2021. Nesse quadro, o percentual de extremamente pobres no mundo está saltando de 9,1% para 9,4% da população mundial de 2019 para 2020, quando estimativa anterior à pandemia era de que a miséria cairia para 7,9% ao final do ano passado.

O Brasil -que alcançara grande avanço na redução da miséria no correr dos dez anos anteriores a 2015-, já vinha apresentando uma elevação da pobreza extrema nos últimos 5 anos. Um dos dados da Pnad Contínua, do IBGE, revela que, em 2019, 13,88 milhões de brasileiros viviam nessa condição, com um acréscimo de cerca de 200 mil pessoas em relação ao ano anterior.

Esse piora na elevação da pobreza extrema no Brasil reflete-se na queda da posição do país no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), mecanismo da ONU que avalia o desenvolvimento das nações em questões básicas como renda, saúde e educação. Neste caso, em 2020, o Brasil piorou sua condição, saindo da 79ª para 84ª pontuação no referido ranking, piorando 5 posições de um ano para o outro. No aspecto do seu enquadramento no PIB entre nações, o Brasil, que já ocupara o posto de 9ª maior economia mundial, passou para o 15º posto, com sinalização de queda.

Foto: William West/AFP

O número de desempregados no Brasil, indicado pelo IBGE é de 14,1 milhões de pessoas, alcançando 14,3% de sua população ativa.

Retomando ao que nos diz Amartya Sem, em sua indispensável obra “Desenvolvimento Como Liberdade”, o desemprego não é meramente uma deficiência de renda, que muitas vezes pode ser compensada por transferências do estado mediante programas emergenciais.

É também uma fonte de efeitos debilitadores muito abrangentes sobre a liberdade, a iniciativa e habilidades das pessoas. Entre os múltiplos efeitos, o desemprego contribui para a exclusão social e acarreta a perda de autonomia, da autoestima, da autoconfiança, e abala a saúde física e psicológica, com o advento de comportamentos desagregadores no núcleo familiar.

Nessa perspectiva, portanto, a pobreza extrema, como vimos observando, deve ser vista como privação de capacidades básicas, ao invés de meramente como baixo ou inexistente nível de renda. E torna-se extremamente grave que dessa tragédia da fome se gere uma tragédia maior ainda, que é o modo como acabamos por aceitá-la, de certa forma naturalizá-la, como parte integrante de um mundo moderno, como se essa miséria não fosse plenamente evitável.

Foto: Cristiano Mariz/VEJA

O Brasil expõe-se ao mundo como uma nação extremamente injusta no que diz respeito à distribuição de seus recursos entre a população. Um país rico, com uma abissal concentração de riqueza nas mãos de uns poucos, e massas contínuas de seu povo entregues às agruras da fome, do desemprego, da falta de oportunidades.

O desenvolvimento que se desejaria, sob a inspiração de Amartya Sem, requer que se removam as principais fontes de privação da liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição social sistemática, negligência e ineficiência dos serviços públicos e a intolerância e interferência de um estado violento e abusivo, habituado a usar seu sistema policial para a repressão contra pobres e negros.

É urgente que se entenda que a miséria é a mais cruel forma de privação da liberdade, tornando a sua vítima impotente para elevação de suas capacidades e, portanto, do alcance mínimo de felicidade.

FONTE: Meio Norte

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